Na beira do lago

Existem coisas tão desconhecidas dentro de nós, que um simples toque acorda emoções que vem de longe, de um tempo que nem sabíamos quem éramos, se é que já sabemos! E aí, desanda na gente, como um pudim levado nas mãos de uma criança, desconfortos, anseios e até aquele “medinho” aparentemente sem propósito.

Bacana, acordo bem disposta, pronta pra cumprir minha parcela nesse mundo e uma frase meio torta ou uma música no rádio do carro, me leva pra um outro planeta, sei lá! Só sei que não é bom, quero voltar, mas daí pra retornar a viagem de um lugar que nem sei qual é impossível! Se ao menos, o gosto, o cheiro, as sensações fossem suaves e letárgicas, como aquele sono que se tira sem poder tirar no meio da tarde, acho até que me atreveria em ficar e conhecer outros “cômodos”, mas é tudo muito impessoal, frio e nem ao menos umas boas vindas eu ouvi, muito chato isso tudo, tava tão bem no meu mundinho de acertos, de fórmulas óbvias e concretas e agora me aparece isso! Sinceramente, não sei o que fiz pra merecer, acho até que tenho sido um bom ser humano, por que fui mandada pra cá?

Ontem mesmo tudo correu bem, como sempre aliás, não fiz nada que pudesse mudar o óbvio de lugar, nem sonhos ou projetos tentei, que é pra não correr o risco de sair do prumo da vida, porque quando acontece parece que a gente vai pra um outro planeta sei lá, ih, mas a sensação é exatamente essa que eu estou vivendo! Será que eu me atrevi a deixar que a vida tocasse sua música e me tirasse pra dança?! Parece estranho essa minha suspeita, até porque tenho muitas qualidades, mas a coragem nunca foi meu forte, pelo contrário, sempre fiquei na beira do lago, na beira da vida e minhas experiências se baseavam na contemplação das sensações do outro, pelo gosto do outro, uma grande espectadora da vida, do outro.
Sabe o que eu acho? Por mais que seja incômodo, depois de um tempinho a gente vai se acostumando e fica até agradável, acho até que vou voltar aqui outras vezes, só é novo, mas e daí? O importante é que não tá doendo mais e isso me conforta um pouco, pra falar a verdade, não tenho vontade nem de ir embora daqui, pensando bem, vou me mudar pra cá, pronto tá resolvido, não volto mais pra aquele outro mundo, onde tudo é óbvio demais, moro aqui e pronto! Se alguém quiser saber, com certeza vai me encontrar bem diferente do que eu fui, pra falar a verdade, nem sei quando me perdi de mim, deve ter sido numa dessas manhãs em que a gente acorda atrasada e nem se dá conta do que esqueceu de levar.

Agora que estou mais acomodada dentro de mim, posso até visitar “outros cômodos” e reunir elementos que me façam mais completa, mais em paz, passei muito tempo vivendo personagens que eram bem úteis, estilos diversos onde a cada ocasião um outro figurino era escolhido pra esconder o que hoje está tão óbvio e eu adoro isso, saber que posso ser eu mesma, sem medo ou insegurança. Vou acordar amanhã e deixar que as coisas aconteçam, sem que eu precise ser uma heroína qualquer de um conto de fadas desbotado e sem graça.

Agora, já posso até fazer escolhas e decidir quem vai habitar comigo esse “planeta” e acho até que aprendi a dizer não! No começo de toda essa mudança, pensei que não daria conta de mim e agora me delicio cada vez que sinto na pele sensações puras, mágicas, sei lá que nome isso tem, também não importa, vou passar a sentir mais e racionalizar bem menos, quem sabe até ficar na beira do lago, mas observando a vida, minha vida, pra seguir viagem certa de que fiz a escolha certa, sei também que haverá tombos, choros e dúvidas, mas também risos e vitórias, pelo simples fato de ter feito escolhas, de permitir que a vida aconteça de fato aqui dentro, que ela seja plena e viver um dia de cada vez, mas inteira, absolutamente, inteira.

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