Não me ofendo porque não dou ao outro o direito de me ofender

“Conhece-te a ti mesmo”. A frase atribuída ao filósofo grego Sócrates é chave importante para o autoconhecimento: se me conheço não me deixo influenciar por aqueles que acham que me conhecem.

Em linguagem jurídica, o ônus da prova é de quem acusa e não de quem é acusado. Isso demonstra que é pura perda de tempo tentar se explicar, se defender ou convencer o outro sobre quem você é. Assim como é perda de tempo analisar o outro na tentativa de buscar uma relação mais prazerosa e harmoniosa.

No dia a dia há situações que nos provocam para o desenvolvimento do autoconhecimento. Certa vez, ao entrar em um supermercado, percebi que uma senhora me olhava de forma intensa e reprovadora. Na hora pensei: “meu Deus, o que fiz de errado?” Como sou uma pessoa bastante atenta e não me permito cometer pequenos “delitos” como parar em vaga de idoso ou furar fila, fiquei intrigada com o seu olhar. Como a loja é pequena, cruzei o caminho da senhora e ela o meu várias vezes sem que o seu olhar deixasse de carregar a ira. E assim foi por cerca de 20 ou 30 minutos enquanto eu colocava as coisas no carrinho.

Terminada a maratona entre as gôndolas, me dirigi ao caixa e, para minha surpresa, a senhora estava na fila do caixa ao lado, na minha direção, e seu olhar era o mesmo. “Caramba”, pensei, “o que é que eu fiz?”

Há algum tempo tenho dedicado meu precioso tempo ao aprendizado do “Conhece-te a ti mesmo” e, com a certeza de quem sou e do que faço, sigo meu caminho determinada a não me deixar influenciar pela opinião alheia. É óbvio que isso não me faz desprezar ou deixar de atentar aos sinais que as outras pessoas possam emitir sobre os impactos provocados pelos meus atos. Muitas vezes as reações das pessoas são mensagens edificadoras para a construção de um ser melhor e mais equilibrado. Ação e reação fazem parte da Lei Natural. Ou seja: recebo o que emano. Não gosto do que recebo? Hummmm...é bom repensar...fiz algo a alguém que não fara para mim mesma? Hummmm...é bom repensar…

Mas, voltando à senhora do supermercado: esqueci dela por alguns minutos enquanto passava as compras. De repente ela me abordou na ponta do caixa e disparou: “Você não é a Marília, filha ingrata que abandonou a mãe em um asilo? Há tempos queria te encontrar para dizer umas boas verdades!”.

Passado o susto da abordagem enfática e raivosa, logo percebi que se tratava de um mal entendido. Foi nessa hora que abri um sorriso e respondi: “Não, não sou. Meu nome é Ana”. Pronto! Tudo resolvido. Desejei um bom dia para aquela senhora indignada com a malvada da Marília que em seu julgamento era uma filha desnaturada.

O que aprendi com isso?

1) O olhar dos outros só me condenará se eu permitir;
2) As pessoas têm motivos para estarem tristes-indignadas-sofridas-amarguradas e desequilibradas. Não julgar os outros já é um bom começo para mim;
3) Se tenho certeza de quem sou porque devo me incomodar com o que os outros pensam?;
4) Eu poderia ter arrumado uma briga daquelas no supermercado se as três lições anteriores já não estivessem latentes em mim.

Pois é, se o tempo já é curto demais para o meu autoconhecimento que dirá para entender o comportamento dos outros?

Não há nenhuma razão (nenhuma!) para jogar luz aos julgamentos alheios. Na verdade, ofensas, afrontas, xingamentos, julgamentos e iras são venenos que as pessoas pensam que estão dirigindo aos outros quando, na verdade, estão colocando em si mesmas. Se não os acolhermos tais sentimentos nocivos eles não ganharão força nem importância e, com isso, se acabam em si mesmos, e o único prejudicado ou prejudicada é quem os projetou.

Há uma frase de Chico Xavier, grande disseminador da Doutrina dos Espíritos, que expressa toda a sabedoria de quem aprendeu que o autoconhecimento é a chave para se conhecer o Universo. Disse Chico certa vez: “Fico triste quando alguém me ofende, mas, com certeza, eu ficaria mais triste se fosse eu o ofensor... Magoar alguém é terrível!”.

Quando penso na senhora do supermercado com seu olhar reprovador me alegro em saber que não sou Marília, a “malvada” que abandonou a mãe em um asilo. Mas eu poderia estar projetando para aquela senhora angustiada um pensamento de raiva que não apenas faria mal a ela como a mim também. Taí uma das vantagens do autoconhecimento: sentir orgulho de si mesma.

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